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Pais entram na Justiça para que filha possa fazer tratamento com maconha
Publicado em 2014-04-01 12:41:22



Portadora da Síndrome CDKL5, doença rara causada por um erro genético, uma criança do DF faz tratamento com um dos componentes da maconha, o canabidiol (CBD), e praticamente zerou o número de convulsões decorrentes da doença, que antes chegavam a 60 por semana.  
 
Como o medicamento é ilegal no Brasil, os pais da menina entraram nesta segunda-feira (31) com uma ação na Justiça Federal de Brasília contra a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), pedindo o direito de importar a substância dos Estados Unidos. A expectativa é que até o final da semana, o juiz já tenha analisado o pedido de liminar.
 
De acordo com a mãe da criança, Katiele Bortoli, as crises convulsivas começaram aos 45 dias de vida de Anny, que hoje tem cinco anos. 
 
— Nessa época fazíamos o tratamento paliativo, com fisioterapia, fonoaudiologia e anticonvulsivos. Mas isso não adiantava. Quando ela tinha quatro anos, a CDKL5 foi diagnosticada.  
 
Após diversas tentativas de tratamento, como o quadro da menina não melhorava, ela chegou a ser submetida a uma cirurgia para controlar a atividade cerebral, por meio da implantação de um VNS, uma espécie de marcapasso.
 
Depois da intervenção cirúrgica as crises de convulsão diminuíram, mas não terminaram.   
 
Até que em um grupo americano de apoio a famílias de portadores da Síndrome CDKL5,  Katiele e o pai de Anny, Noberto Fischer, descobriram que uma criança estava usando o CBD com bons resultados nos EUA. Após conversar com o pai da criança americana, o casal conseguiu trazer o medicamento para o Brasil e passou a administrar na filha que, segundo a mãe, também apresentou melhora significativa.  
 
— Em uma semana, a gente notou uma diferença drástica no número de crises. Com nove semanas, ela não teve nenhuma convulsão. Ela ainda tem uma crise ou outra, mas bem melhor que as 60 por semana.   
 
De acordo com o pai, Anny também se tornou mais ativa, após ter começado o tratamento com o CBD.  
 
— Ela passava quase 24 horas por dia dormindo, porque ela dormia após as crises.  Hoje ela nos olha nos olhos, reclama, chora, reage, a gente fala o nome dela e ela até vira o rosto.  Ela está voltando a entender qual é o nome dela.   
 
O CBD é importado dos Estados Unidos pela família em forma pastosa dentro de uma seringa de 3g sem agulha. Anny ingere uma dose diária do medicamento, correspondente ao tamanho de um grão de arroz.  
 
Katiele diz que durante um período em que eles não conseguiram trazer o medicamento para o Brasil, os pais acompanharam o retorno das convulsões gradativamente.   
 
— Até que a gente conseguiu a medicação de novo e vimos as crises pararem novamente.  Hoje ela nem precisa mais usar um dos remédios anticonvulsivos.   
 
Embora não possa receitar o tratamento com o canabidiol, que não é regulamentado no Brasil, o neurologista da criança foi informado que ela passaria fazer o tratamento com CBD e, segundo Katiele, ficou impressionado com a melhora clínica da menina.   
 
O neurocientista e professor do Departamento de Ciências Fisiológicas da UnB (Universidade de Brasília) esclarece que como o CBD é o canabidiol isolado, sem THC, a substância não tem a propriedade de alterar a percepção de quem usa. O CBD funciona impedindo o excesso de ativação de determinados neurônios.   
 
— Com isso, ele é capaz de evitar convulsões como nenhum outro remédio é capaz.  Essa síndrome é caracterizada por um quadro de epilepsia muito grande. São tantas convulsões que elas vão, literalmente, queimando o cérebro de uma criança e, eventualmente, destruindo o cérebro.  
 
Segundo o pesquisador, o canabidiol é apropriado para esses casos justamente porque não tem os efeitos psicoativos do THC, que para uma criança pode causar problemas para o desenvolvimento cognitivo.   
 
— Isto é, ele consegue tratar a criança sem esses efeitos colaterais. Pelo contrário, ela apresenta uma clareza de pensamento e às vezes  pode salvar a vida dela.  
 
De acordo com o neurocientista, o canabidiol também pode ser indicado para alguns casos de autismo, que é caracterizado por excesso de atividades cerebrais.
 
Contrário aos argumentos favoráveis à legalização da maconha, o psiquiatra Valdir Campos, que é especialista em Dependência Química pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), argumenta que a planta tem mais de 400 substâncias nocivas à saúde. No entanto, ele não se opõe ao uso medicinal da substância se ela puder ser utilizada no tratamento de doenças.
 
Pesquisa divulgada no último dia 26 de fevereiro revela que 57% da população apoia a legalização da venda da maconha para fins medicinais e com a apresentação de uma receita médica. Ao passo que para 37% dos entrevistados a maconha deve continuar totalmente proibida.
 
Legalização
 
O polêmico debate sobre a legalização da maconha entrou na pauta dos políticos em Brasília. Apesar de a discussão se arrastar há anos entre intelectuais e mesmo nas ruas, o debate chegou em 2014 ao Congresso Nacional.
 
A proposta não partiu do Legislativo, mas veio de uma iniciativa popular apoiada por mais de 20 mil assinaturas na internet. A legalização da droga para os usos recreativo, medicinal e industrial pode virar projeto de lei.


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